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Laço Vermelho

Quase 37 milhões de pessoas vivem com HIV no mundo, e o preconceito ainda é a principal barreira enfrentada pelos soropositivos

Larissa Santos/TS | Ed. 94 Nov 2018

Larissa Santos

H-I-V. Três letras do alfabeto que, juntas, representam um vírus que ataca o sistema imunológico responsável por defender o organismo de doenças e atinge células que se multiplicam e se espalham pelo corpo.

Por décadas, o vírus da Imunodeficiência Humana (ou Human Immunodeficiency Virus) gerou temor entre os seres humanos, principalmente pela possibilidade de causar a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, mais conhecida como Aids. 

 

Isso porque, no início, o diagnóstico positivo da Aids era considerado uma sentença de morte. Sem o tratamento e a medicação necessária, a perspectiva de vida de um soropositivo era mínima. Por falar em início, é importante entender a história da Aids ao longo do tempo. Veja no infográfico abaixo os principais acontecimentos que marcaram a síndrome.

Os números – Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAids), o número de pessoas que vivem com HIV no mundo já somava em 2017 quase 37 milhões. Em média, cerca de dois milhões de pessoas são infectadas pelo vírus a cada ano, e a estimativa é que mais de nove milhões não façam ideia de que vivem com HIV.

No Brasil, de 1980 até junho de 2018 foram diagnosticados mais de 980 mil casos da síndrome. Isso implica a média anual de 32 mil soropositivos, de acordo com o Ministério da Saúde.

Somente no período de 11 anos (2007-2018), foram quase 250 mil diagnósticos liderados pela região Sudeste, responsável pelo maior número de casos (47,4%), seguida pela Sul (20,5%), Nordeste (17%), Norte (8%) e Centro-Oeste (7,1%). Nesse mesmo intervalo, o Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan) notificou incidência maior da síndrome em homens do que em mulheres: 169 mil contra 77 mil.

Entre os homens, quase 60% das infecções decorreram de exposição homossexual ou bissexual, 36,9% heterossexual e 2,6% por meio de drogas injetáveis (UDI). Já entre as mulheres, 96,8% adquiriram o vírus por exposição heterossexual e 1,6% por UDI. O grupo etário que mais apresentou infecção do HIV no período foi o de 20 a 34 anos, que totaliza 52,6% dos casos diagnosticados.

Apesar de todos esses dados, a partir de 2012 a taxa de detecção tem sido reduzida significativamente, passando de 21,7 por 100 mil habitantes em 2012 para 18,3 em 2017.

Atualmente, são aproximadamente 870 mil brasileiros que vivem com HIV, sendo 559 mil homens e 307 mil mulheres.

O vírus e a síndrome – Em 2017, cerca de 40 mil brasileiros foram diagnosticados com HIV; desses, 37 mil tinham Aids. Essa informação revela que nem todo mundo que tem o vírus desenvolve a síndrome.

O infectologista Manuel Palácios, em entrevista ao Jornal de Brasília, explica: “A Aids é o estágio mais avançado da doença que ataca o sistema imunológico”. Ele esclarece que a Aids é causada pelo vírus HIV, que, por sua vez, deixa o organismo mais vulnerável e permite infecções que elevam a mortalidade dos pacientes; entretanto, “há soropositivos que vivem muitos anos sem apresentar sintomas e sem desenvolver a síndrome”.

Apesar disso, mesmo que não desenvolvam a Aids, pessoas com HIV ainda podem transmitir o vírus. Daí a importância da realização de testes periodicamente e da busca de tratamento, que pode fazer com que o vírus se torne indetectável, evitando a reprodução e a transmissão.

Transmissão – Há 30 anos pessoas com Aids tinham, em média, três anos de vida a partir do diagnóstico. Por se tratar de uma doença nova e sem informações concretas, preconceitos rodeavam o assunto.

Diante da falta de informação, passou-se a acreditar que atos como abraçar, compartilhar copo e talher e até mesmo tocar em soropositivos eram ações que transmitiriam o vírus HIV. Porém, com o avanço das pesquisas científicas, foi comprovado que essas não são maneiras de infecção do vírus. Como demonstra a tabela, a principal forma de transmissão do HIV é o contato sexual, afinal, o vírus também está presente no esperma e na secreção vaginal, enquadrando-se a doença na categoria de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST)*.

O HIV também pode ser transmitido da mãe para a criança durante a gestação, a amamentação e, principalmente, o parto (a chamada transmissão vertical), mas essa infecção pode ser evitada com o tratamento adequado.

Sintomas e fases – Duas horas após contrair o vírus, as alterações no sistema imunológico começam a ocorrer devido à replicação do vírus. Essa é categorizada como a primeira fase, chamada de infecção aguda.

O período do momento de exposição ao vírus até o surgimento dos primeiros sinais varia de três a seis semanas. Os sintomas são parecidos com os da gripe, tais como febre e mal-estar. Na segunda fase, ocorre interação entre as células de defesa do organismo e as mutações dos vírus que são rápidas e constantes. Apesar disso, o corpo não está enfraquecido o suficiente para adquirir infecções oportunistas, como a Aids, porque os vírus se replicam e morrem de forma equilibrada.

Os sintomas nesse período são inexistentes e isso pode durar anos. Em função do ataque frequente, as células de defesa podem ser destruídas e o organismo fica cada vez mais fraco e vulnerável a infecções. Febre, diarreia, suor noturno e emagrecimento são sintomas mais comuns dessa fase.

A partir desse ponto, com a evolução do vírus e a baixa imunidade causada por ele, atinge-se o estágio mais avançado: a Aids. Ao chegar a essa fase, o paciente pode apresentar hepatites virais, tuberculose, pneumonia, toxoplasmose e alguns tipos de câncer. Mas é importante ter a consciência de que o vírus não necessariamente evoluirá para a Aids. Esse processo pode ser evitado desde que o HIV seja diagnosticado no início e tratado adequadamente.

Diagnóstico e tratamento – O Brasil foi um dos primeiros países a fornecer tratamento gratuito para soropositivos. Nos termos da Lei nº 9.313/1996, pessoas que vivem com HIV têm direito ao acesso gratuito da medicação para o tratamento por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

O tratamento consiste, basicamente, na ingestão de medicamentos que fortalecem o sistema imunológico a fim de se prolongar o tempo e a qualidade de vida dos soropositivos e se reduzir a possibilidade de infecção por doenças oportunistas. Todavia, antes de tratar é necessário realizar o diagnóstico. Os testes são feitos por meio da coleta de sangue ou por fluido oral e têm várias opções diferentes.

A primeira alternativa é o teste rápido, que é oferecido gratuitamente pelo SUS, pode ser feito de forma anônima e detecta a presença de anticorpos contra o HIV em aproximadamente 30 minutos. Esse exame pode ser feito em unidades de saúde e também em Centros de Testagem e Aconselhamentos (CTA), onde há orientação para facilitar a compreensão do resultado pelo paciente.

Outra maneira de verificação é o autoteste, que já é vendido nas farmácias, e a previsão é que também seja distribuído pelo SUS em janeiro de 2019. Mas, embora esse teste seja aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e tenha eficácia de 99,9%, o exame só é capaz de detectar o HIV 30 dias após a exposição ao vírus, de acordo com o Ministério da Saúde. O período mínimo entre a exposição ao risco e o momento de fazer o teste é chamado ‘janela imunológica’.

É necessário estar sempre atento ao teste e questionar sempre que houver dúvidas.

Para o autoteste, as recomendações do Ministério da Saúde são:

 

  • Resultado negativo: repetir o teste 30 dias depois e outra vez depois de mais 30 dias até completar 120 dias da exposição ao risco;

  • Resultado positivo: procurar um serviço de saúde do SUS para confirmar o resultado com testes laboratoriais e encaminhamento para o tratamento gratuito, se necessário.


Em todos os casos, para se ter um diagnóstico exato do vírus é necessário fazer dois exames para se evitar o chamado resultado “falso positivo”, e somente um profissional da saúde pode dar um diagnóstico definitivo de HIV.

Nos casos de possíveis exposições ao vírus em qualquer meio de transmissão, é possível buscar o tratamento com a Profilaxia Pós-Exposição (PEP) em uma unidade de saúde em até 72 horas após o contato.

Existe também a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), que consiste na ingestão diária de medicamento antes do contato com o soropositivo, diminuindo em até 80% a possibilidade de infecção. A PrEP é oferecida desde janeiro de 2018 pelo SUS e sua eficácia independe da situação do parceiro com HIV.

Para saber onde encontrar um serviço de saúde e ter acesso ao tratamento ou ao diagnóstico acesse o site do Ministério da Saúde.

Deu positivo, e agora? – Ao receber o diagnóstico positivo de um teste de HIV, o primeiro sentimento é o medo. Medo da morte e do que os outros vão pensar. A morte, como visto, é completamente evitável a partir do diagnóstico e do tratamento. Porém, o medo do que os outros vão pensar é inevitável.

Isso porque o preconceito ainda gira em torno da doença, talvez não tanto quanto acontecia há 30 anos, mas ainda é frequente. Lucas Raniel, 26 anos, conhece bem as consequências que isso pode trazer.

Ele é soropositivo há cinco anos e contraiu o vírus em uma festa com uma pessoa que conheceu por um aplicativo de relacionamento. Após a infecção, sentindo dor de cabeça, emagrecendo e com manchas vermelhas pelo corpo, Lucas procurou um médico que pediu o exame de HIV.

Com a confirmação do resultado positivo, para ele tudo era morte. Saiu do consultório desesperado e tentou suicídio. Sua mãe o impediu. depois de alguns meses ele se estabilizou emocionalmente e começou o tratamento.

Porém, a notícia se espalhou pela cidade onde mora, e Lucas se tornou vítima de bullying e de preconceitos. “É uma cidade pequena, com uma comunidade LGBT onde todo mundo conhece todo mundo. Meu rosto já estava marcado por conta dessa fofoca. Eu ia ao bar LGBT e comecei a perceber os olhares. Então, fui me fechando de novo, voltei para a depressão. Dessa vez, tive uma depressão profunda mesmo e tentei o suicídio pela segunda vez”, relembra.

Após passar por tratamento psiquiátrico, ele se recuperou e hoje ajuda pessoas que estão na mesma situação em que ele já esteve. O apoio acontece por meio dos projetos “Boa Sorte” e “Deu Positivo, e Agora?”.

Quebrar esse preconceito para que pessoas com HIV não passem pelo que o Lucas passou é um dos objetivos da campanha Dezembro Vermelho, iniciada no Brasil em 1º de dezembro de 2017 por meio da Lei nº 13.504.

Dezembro Vermelho é composta de atividades e de mobilizações para a luta contra a Aids e o HIV com foco na prevenção, assistência, proteção e promoção dos direitos humanos das pessoas que vivem com o vírus e a síndrome.

A campanha de 2018 foi inspirada nos 30 anos do Dia Mundial da Luta Contra a Aids, instituído pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e lembrado no dia 1º de dezembro de cada ano.

O Ministério da Saúde cobriu o gramado da Esplanada dos Ministérios, em Brasília/DF, com um mosaico de colchas de retalhos feitas por pessoas que se sensibilizam com a causa. A prática de confecção das colchas era comum nos anos 80 para lembrar as vítimas da Aids, e o ato foi realizado para relembrar as lutas e celebrar as conquistas globais relacionadas ao HIV.

Vestindo a camisa – Em 30 anos lutando contra a Aids, o governo brasileiro investiu em políticas públicas que aumentassem a expectativa e a qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV. Um exemplo disso foi a gratuidade do diagnóstico, do tratamento e da medicação.

A eficácia de atitudes como essa são refletidas em dados do Ministério da Saúde que demonstram a queda da taxa de mortalidade da doença, passando de 5,7 por 100 mil habitantes em 2014 para 4,8 em 2017.

“É a primeira vez em 20 anos que temos uma queda tão expressiva na taxa de mortalidade”, ressalta Adele Benzaken, diretora do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Ela relembra que a última vez que houve diminuição tão expressiva na taxa de óbitos foi depois da chegada da terapia tríplice, conhecida como coquetel, entre 1996 e 1997.

A taxa de detecção de HIV em bebês também apresentou queda: 43% em dez anos, entre 2007 e 2017; caindo de 3,5 casos por 100 mil habitantes para dois a cada 100 mil. O saldo é positivo, mas ainda não é o suficiente.

É preciso vestir a camisa da prevenção e investir na conscientização da sociedade sobre o vírus e a síndrome, como afirma o ministro da Saúde, Gilberto Occhi: “O Brasil tem dado a sua contribuição no combate à doença com garantia de tratamento e oferta de testes para identificar o vírus, mas é preciso conscientização da população, principalmente dos jovens, sobre a necessidade da prevenção”.

Apesar de ser possível que um soropositivo viva normalmente e com qualidade, a Aids não tem cura e pode se associar a doenças que levam à morte caso não haja tratamento.

Esteja atento aos sinais e conscientize-se!

A prevenção é o melhor caminho.


 

*Terminologia que substitui a expressão DST, porque dá ênfase à possibilidade de se transmitir uma infecção mesmo sem sintomas.

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Larissa Santos

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