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Simone Giovini/Associação Floresta Protegida - Reprodução

Todo dia é dia
de ÍNDIO

Pleitos de várias etnias indígenas são reconhecidos pelo Tribunal no mês em que se comemora o Dia do Índio

Leonardo Costa/TS | Ed. 87 Abr 2018

Hoje, segundo dados da Fundação Nacional do Índio (Funai), a população indígena brasileira soma 817.963 mil índios, representando 305 diferentes etnias e 274 línguas distintas. Com parcela considerável da população brasileira (0,26%) e direitos expressos na Constituição de 1988, que assegura aos indígenas o respeito à organização social, aos costumes, às línguas, às crenças e às tradições, os nativos vêm, a cada ano, buscando mais o Judiciário em busca da preservação e garantia de seus direitos.

No mês em que se celebra o Dia do Índio, comemorado no dia 19 de abril, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) realiza uma série de ações relacionadas ao Direto Indígena. Trata-se de processos que tramitavam há anos e que se enquadram nas metas de julgamento estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para o Poder Judiciário.

Composta pelas 5ª e 6ª Turmas, a 3ª Seção, atualmente presidida pelo desembargador federal Souza Prudente, é o órgão julgador do Tribunal competente para analisar especificamente os processos relacionados aos índios. Para o magistrado, o esforço concentrado do Tribunal para a apreciação das causas indígenas tem papel importante de interesse social que se refle na sociedade como um todo. “As questões indígenas são da maior relevância, porque nós temos que afirmar a nossa competência jurisdicional que abrange 80% do território nacional, inclusive tutelando jurisdicionalmente os maiores biomas do planeta”.

Direito à comunicação – No dia 2 de abril, a 6ª Turma do TRF1, à unanimidade, negou provimento às apelações da sentença do Juízo Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária de Goiás (SJGO) que determinou a instalação, pela Brasil Telecom (adquirida pela empresa Oi), de um Telefone de Uso Público (TUP) na comunidade indígena Tapuia, da terra indígena Carretão, localizada na região de Rubiataba, em Goiás, ficando a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) responsável pela fiscalização. A decisão beneficia 172 pessoas (160 índios e 12 não índios) que vivem na aldeia situada a 273 km de Goiânia.

A ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) obteve sucesso já em 1ª instância, com o cumprimento da sentença e a consequente instalação do equipamento telefônico na comunidade. Insatisfeitas com a decisão, as partes recorreram ao Tribunal.

O procurador regional da República Felício Pontes Jr, em sustentação oral durante o julgamento, argumentou que o direito à comunicação é um direito fundamental. "A telefonia nas aldeias salva vidas. Em muitas ocasiões, é o telefone que informa aos agentes de saúde da necessidade de remoção de pacientes, sobretudo por conta de doenças com as quais os indígenas não sofriam até o contato com os brancos", disse o procurador. Para ele, a falta de instalação dos telefones públicos acarreta dano irreparável à etnia.

A empresa concessionária dos serviços de telefonia alegou, em seu recurso, não existir obrigação legal para a instalação de telefonia pública na comunidade, pois, de acordo com os contínuos monitoramentos que a companhia realiza, a aldeia indígena não era considerada uma “localidade”.

Ao analisar a questão, a relatora, juíza federal convocada Rosana Noya Kaufmann, ressaltou que o telefone deve ser mantido na comunidade. Segundo a magistrada, a partir da Lei nº 9.472/97 e dos Decretos nºs 2.592/98 e 4.769/03, a comunidade indígena Tapuia se constitui “localidade”, sob o fundamento de que foram atendidos os requisitos para tanto, quais sejam: conta com edificações permanentes e adjacentes, uma sede, composta por escola, igreja, campo de futebol, posto de Fundação Nacional do Índio (Funai) e da Fundação Nacional de Saúde (FNS), contendo, aproximadamente, 65 residências e possui mais de 100 habitantes, de acordo com o censo realizado pela FNS”.

Quanto à alegação da Brasil Telecom de que a aldeia indígena não seria classificada como localidade, a juíza destacou que o entendimento do TRF1 é de que não deve se conceituar rigorosamente “localidade” como sendo um conjunto de “edificações permanentes e adjacentes, formando uma área construída com arruamentos reconhecíveis”, não havendo necessidade de aldeia indígena se enquadrar com exatidão matemática a esse conceito, devendo, ao contrário, ser adaptado o referido conceito às características próprias de aldeia indígena.

A magistrada ressaltou que, de acordo com a Lei nº 9.472/97, a Anatel tem o dever de garantir a toda a população o acesso às telecomunicações com padrões de qualidade e de regularidade adequados à sua natureza, em qualquer ponto do território nacional.

Água de beber – Já no dia 6 de abril, a 5ª Turma do TRF 1ª Região manteve decisão do Juízo Federal de Teófilo Otoni/MG que determinou que a União, a Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai) e do Distrito Sanitário Especial Indígena em Minas Gerais e Espírito Santo promovam o fornecimento de água potável adequada ao consumo humano para a comunidade Indígena Nokuriñ, localizada no Córrego Pezinho, no município de Campanário/MG. O fornecimento deve ser feito inicialmente por intermédio de caminhões-pipa ou por outro meio equivalente e, posteriormente, por meio de sistema completo de captação, tratamento, armazenamento e distribuição de água, sob pena de multa.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Souza Prudente, destacou que não é admissível a falta de fornecimento de água potável a determinadas aldeias indígenas por parte da administração pública, considerando-se a essencialidade do bem pretendido, impondo-se, na espécie, a intervenção do Poder Judiciário para assegurar o direito à saúde e à vida das comunidades indígenas, que se encontram constitucionalmente tuteladas.

O magistrado ressaltou, ainda, que a cláusula da reserva do possível não pode ser invocada pelo poder público com o propósito de fraudar, frustrar e inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição, e encontra “insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade do ser humano.

A noção de mínimo existencial, segundo o desembargador, resulta de preceitos constitucionais e compreende um “complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar à pessoa o acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança”.

Demarcação de terras – Finalmente, no dia 25, a 5ª Turma do TRF1 realizou esforço concentrado para o julgamento de vários processos que tratam da demarcação e reintegração de terras tradicionalmente ocupadas pelas comunidades indígenas de várias etnias.

A presidente da Turma, desembargadora federal Daniele Maranhão, levou a julgamento processos de sua relatoria que versam sobre a revisão de procedimento demarcatório realizado anteriormente à Constituição de 1988 para adequação à norma constitucional vigente à luz do entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o assunto. De acordo com a magistrada, “titulações expedidas por ente estatal e eventual registro imobiliário não obstam o reconhecimento da área como tradicionalmente ocupadas pelos índios, dada a natureza original dessa ocupação”.

Comunidade Tupinambá da Serra do Padeiro: sob relatoria do desembargador federal Souza Prudente a Turma deu provimento à apelação da Funai e do MPF contra a sentença da Subseção Judiciária de Ilhéus/BA que julgou procedente a demanda ao fundamento de que haveria de se privilegiar a posse dos autores até posterior exame aprofundado do direito dos índios sobre a ocupação das terras.

Segundo o relator, considerando informações da Funai, a área seria tradicionalmente ocupada por silvícolas, encontrando-se, inclusive, em processo de regularização fundiária para fins de futura demarcação de reserva indígena, a qual, uma vez homologada, tornaria inválidos quaisquer títulos dominiais incidentes sobre aquela área, conforme decidido pelo STF.

O desembargador esclareceu que “na hipótese em exame, embora não se cogite da inclusão da área em que se encontra localizado o imóvel objeto da pretensão possessória nos limites territoriais da reserva indígena a que se reporta a aludida Ação Cível Originária nº 312/BA, noticiam os elementos carreados para os autos que a mesma área se encontra inserida em processo de regularização fundiária, para fins de futura demarcação administrativa, a desautorizar, em princípio, a concessão da tutela postulada, antes mesmo da sua adequada delimitação, prestigiando-se, assim, o princípio da segurança jurídica”.

Comunidade Myky: os processos envolvendo a demarcação da terra indígena Menkü, da Comunidade Myky, foram julgados simultaneamente. Em todos os casos o pleito da Fundação Nacional do Índio (Funai) para que seja feita a revisão da demarcação original das terras foi julgado procedente. “Configura-se a nulidade do processo demarcatório original por ter sido promovido por fazendeiro com interesses contrapostos; não estar lastreado em levantamento fundiário, em flagrante desatenção ao que dispõe do Decreto nº 76.999/1976; haver inconsistências não sanadas e devidamente apontadas pelo engenheiro agrônomo que atuou no processo demarcatório original que resultou em usurpação de parte da área originalmente ocupada pela comunidade indígena Myky”, fundamentou a desembargadora Daniele Maranhão.

A magistrada citou jurisprudência do STJ no sentido de ser “viável a revisão de processo demarcatório realizado anteriormente à Constituição de 1988 para adequar-se à norma constitucional vigente”. Para concluir, a relatora asseverou que a decisão proferida no julgamento da demarcação da área indígena Raposa Serra do Sol não é vinculante e não se aplica a outros casos em que se discute a possibilidade de revisão de demarcação de terras indígenas antes da CF/88, havendo de prevalecer as particularidades de “cada caso concreto”.

Ao finalizar o esforço concentrado, a indígena Rosinês Manuki, que estava presente acompanhado a sessão, comemorou a decisão do Tribunal sobre a demarcação da terra indígena Menkü, onde vive, no noroeste do Mato Grosso, mas lembrou que a luta indígena para ter seus diretos reconhecidos continua: “ainda vamos batalhar mais pela demarcação das nossas terras, pra nos proteger, pra podermos respirar um ar limpo e beber água de qualidade”.

Assessoria de Comunicação Social
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Praça dos Tribunais Superiores SAU/SUL 5 - Asa Sul, DF, 70070-900

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