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Image by Sharon McCutcheon

UM NOVO CORPO

Decisão da 6ª Turma do TRF1 garante a uma pessoa trans que o Estado forneça tratamento hormonal a ela antes de cirurgia de mudança de sexo

Daniela Garcia/CB  | Ed. 103 Out 2019

Uma vida inteira convicta do próprio gênero. Desde criança, Sabrina Moraes já se via como menina – embora na sua certidão de nascimento contasse o sexo masculino. Enfrentou a exclusão da família e chegou a ser casada com uma mulher. Mas em 2009, começou a mudar o próprio corpo para enfim se reconhecer como mulher. Sob orientação médica, consumiu hormônios e em 2015 fez a cirurgia de transgenitalização. Pagou R$ 30 mil, em um hospital de Goiânia-GO.

Hoje, a bancária conta que se sente realizada. “Eu fiz a cirurgia para me olhar e me reconhecer e foi um êxtase, foi maravilhoso”.

Diferentemente de Sabrina, há pessoas que nasceram mulheres mas se identificam como homens. Muitas buscam o centro cirúrgico para também modificar o corpo. Em Brasília – DF, o cirurgião plástico Érick Carpaneda não realiza operação de readequação sexual. Porém se tornou referência quando o assunto é mastectomia masculinizadora em transgêneros – que é a retirada completa dos seios.   

“Essa é uma cirurgia relativamente nova, já que o transgênero foi caractarizado mais recentemente e os protocolos começaram a surgir agora”, explica o médico. Ele acrescenta que é fundamental o acompanhamento psicológico, já que essa é uma cirurgia definitiva.

O médico diz que, nesses casos, a transição hormonal por meio de medicamentos é importante para um melhor resultado da imagem que o transgênero visa ter. E foi justamente para ter esse tipo de medicação que uma transexual procurou a Justiça Federal de Minas Gerais, disposta a conseguir um remédio bloqueador de testosterona.

Segundo a ação, a paciente fez o tratamento que antecede a cirurgia de transgenitalização e um laudo médico demonstrou a necessidade de se tomar a medicação. Sem condições de arcar com os custos, ela conseguiu uma decisão favorável na 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Uberlândia, Minas Gerais.  

Mas o município de Uberlândia recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, juntamente com o estado de Minas Gerais e a União. Ao analisar o recurso, a 6.ª Turma do TRF1 negou a apelação, e determinou o fornecimento do medicamento Androcur (ou genérico de mesmo princípio ativo), enquanto durar o tratamento da paciente em processo de transgenitalização, dada a condição de hipossuficiente dela.

Consta dos autos documentos que a autora da ação fazia o tratamento no Ambulatório Amélio Marques da Universidade Federal de Uberlândia, integrante do Projeto Ambulatório Saúde das Travestis e Transexuais, vinculado ao Programa “Em Cima do Salto: Saúde, Educação e Cidadania”, sendo necessário o acompanhamento interdisciplinar pelo mínimo de dois anos que antecede a cirurgia de transgenitalização e outros procedimentos cirúrgicos”, havendo prescrição da medicação na posologia de “1 comprimido de 12 em 12 horas”, uso contínuo.

De acordo com o relator, desembargador federal João Batista Moreira, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de que “o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente”.

A advogada Marilene Carneiro explica que em casos como esse, prevalecem os direitos previstos na própria Constituição Federal. “O primeiro fundamento é o direito à vida e à dignidade da pessoa humana. A partir daí, as pessoas têm o direito à saúde e ao medicamento”, explica. Segundo ela, o STF já fez uma audiência pública sobre o tema, quando “foi verificado que essa é uma questão grave de saúde. Há pessoas que se matam”, acrescenta.

SUS

A cirurgia de readequação sexual é regulamentada pelo Ministério da Saúde. Desde 2008, o Sistema Único de Saúde realiza esse procedimento em mulheres trans – pessoas que nascem com o sexo masculino mas se identificam com o feminino. “Se o Estado fornece a cirurgia, deve necessariamente fornecer o medicamento pré-cirúrgico”, comenta a advogada.

O médico Érick Carpaneda vai além, já que presencia diariamente esse drama vivido por transexuais. “É a transição final. Uma pessoa que vive presa a um corpo que não lhe pertence. O transgênero precisa dessa cirurgia para se completar, porque ele já mudou há muito tempo, mas não estava em consonância com o seu eu exterior”, analisa.

Processo nº: 0005860-29.2015.4.01.3803/MG

Data do julgamento: 12/08/2019
Data da Publicação: 23/08/2019

Assessoria de Comunicação Social
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

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