Juizados especiais: presente e futuro
Os Juizados Especiais completaram neste ano 25 anos de prestação jurisdicional: um projeto tão exitoso que já corresponde a 35% da demanda judicial de primeiro grau. Evento do CNJ contou com a participação de desembargadores do TRF1 para comemorar a data e apontar novos caminhos
Leonardo Costa | Ed. 112 Agosto 2020
Eles foram criados para promover a democratização da Justiça brasileira. Há 25 anos, passaram a proporcionar a conciliação entre as partes e um processo célere, econômico e efetivo. Assim, por meio da Lei nº 9.099 de 26 de setembro de 1995, nasceram os Juizados Especiais. Um projeto que deu muito certo.
Atualmente, existem 1.494 juizados especiais autônomos no Brasil, além de 2.700 varas que funcionam com juizado especial adjunto. Conforme dados do Relatório Justiça em Número de 2019, a demanda desse sistema de Justiça já corresponde a 35% da demanda de primeiro grau.
Considerada como evolução no Poder Judiciário, a criação da Justiça Especial na Justiça Estadual migrou para a Justiça Federal. Em 12 de julho de 2001, com a Lei nº 10.259, foram criados os Juizados Especiais Federais (JEF). Dentro desse contexto, os JEFs da Primeira Região tiveram início efetivamente em março de 2002 com a conversão da 15ª Vara Cível da Seção Judiciária da Bahia em Vara de JEF.
Na 1ª Região, os jurisdicionados contam com 176 varas de Juizados Especiais Federais (JEFs) e 25 Turmas Recursais espalhadas pelo Distrito Federal e pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins. As turmas recursais são integradas por juízes em exercício no primeiro grau responsáveis pelo julgamento de recursos contra decisões dos juizados especiais.
Comemoração dos 25 anos
Para celebrar os 25 anos de criação dos Juizados Especiais, constituídos, com o passar dos anos, em importante ferramenta para consecução dos objetivos sociais previstos na Constituição Federal, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) promoveu, no dia 13 de agosto, o Seminário Digital 25 Anos dos Juizados Especiais. Diagnóstico e Perspectivas.
O evento, que contou com a participação do coordenador dos Juizados Especiais da 1ª Região (Cojef), desembargador federal Ney Bello, da desembargadora federal Daniele Maranhão e da juíza federal Lívia Cristina Marques Peres, da Seção Judiciária do Amapá e auxiliar da Presidência do CNJ, foi aberto pela juíza federal da 1ª Região Candice Lavocat Galvão Jobim, conselheira do CNJ.
Em seu pronunciamento, a magistrada destacou a criação dos Juizados Especiais como uma ferramenta essencial para o Poder Judiciário e que democratizou o acesso à Justiça. “A Lei 9.099 que instituiu e regulamentou o funcionamento dos juizados especiais completa seus 25 anos. Quem dos que aqui estão não se lembra de sua festejada criação? Tendo como embrião os antigos 'Juizados de Pequenas Causas', criados em 1984, que se aperfeiçoaram até o estabelecimento de um novo sistema com a entrada em vigor da Lei 9.099 de 1995, que foi um verdadeiro divisor de águas do Judiciário Brasileiro”.
Segundo Candice, o CNJ vem atuando para concretizar os princípios que norteiam os processos em trâmite nos juizados especiais, dando especial atenção à solução consensual dos conflitos.
O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, representando o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, destacou que a intenção do seminário não é apenas comemorar os 25 anos da Lei nº 9.099/95, mas, sobretudo, contribuir para que o Poder Judiciário possa cada vez mais se consolidar no papel de garantidor dos direitos fundamentais que lhe foram confiados pela Constituição Federal.
Para o ministro, a criação dos Juizados Especiais representou uma verdadeira revolução no sistema jurisdicional brasileiro, liberando-o das amarras formais e conservadoras do processo tradicional. “A Lei nº 9.099/95 foi a precursora do movimento de incentivo à conciliação e à mediação e que hoje é importante instrumento em todas as esferas do Direito e essencial à conclusão pacífica dos conflitos”.
Humberto Martins citou também a edição da Recomendação 37/2019 , da Corregedoria Nacional de Justiça, que dispõe sobre a instalação e a implementação da Justiça Itinerante. Ele destacou a decisão do Plenário do CNJ que assegurou ao cidadão não assistido por advogado o direito de peticionar diretamente pelo PJe, no âmbito dos juizados especiais cíveis, com um certificado digital.
Um ciclo de palestras com o primeiro Painel “Juizados Especiais: Passado, Presente e Futuro. 25 anos da Lei nº 9.099/95” se deu com a participação de nomes relevantes do Judiciário, entre os quais o do ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal e autor do Projeto de Lei dos Juizados Especiais Nelson Jobim; dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca e Marco Buzzi e do desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Kazuo Watanabe.
Diagnóstico dos Juizados
Outro Painel, este sob a coordenação do juiz auxiliar da Presidência do CNJ Carl Olav Smith, foi apresentado pela diretora do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, Gabriela Moreira de Azevedo Soares, sobre um diagnóstico da situação presente e da desejada para os Juizados Especiais. O estudo foi realizado pelo Grupo de Trabalho criado mediante a Portaria 126/2019 a partir de pesquisa feita no primeiro semestre pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ para conhecer o funcionamento e a estrutura dos juizados especiais por todo o País. O trabalho englobou a atuação dos Juizados Especiais Estaduais, Federais, Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública.
A pesquisa apontou que o tempo médio de tramitação de um processo na Justiça Estadual da Justiça Estadual é quase dois anos menor que a tramitação dos demais processos de 1º grau. As ações terminam, em média, após um ano e seis meses de tramitação, enquanto casos levados à Justiça comum duram, em média, três anos e sete meses.
Entre os dados apresentados pela servidora, ficou evidenciado que no âmbito da Justiça Federal os juizados tiveram um crescimento na demanda processual de 81,3% desde a criação. Mesmo diante desse crescimento, a taxa de congestionamento reduziu de 52% para 46%.
O estudo do CNJ foi respondido por 60% dos juizados especiais estaduais (2.220) e 66% dos federais (389) de um universo de 3.727 (Justiça Estadual) e 590 (Justiça Federal). A pesquisa revelou que essas unidades têm sido cada vez mais demandadas ao longo dos anos e conseguem grau de solução superior aos da justiça comum.
Dos 30 tribunais brasileiros que responderam aos questionamentos para realização do estudo no ramo da Justiça Federal, apenas o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) informou que realiza itinerância. Em 2019, o TRF1 realizou 7 itinerâncias em 22 municípios atendendo a cerca de 9 mil pessoas. Ao todo foram proferidas 5.059 sentenças. Dos Tribunais de Justiça, 16 informaram que realizam esse tipo de serviço.
Inclusão Digital
O coordenador dos Juizados Especiais Federais da 1ª Região, desembargador federal Ney Bello, diante da pandemia vivenciada, ressaltou a importância da realização das audiências, das atermações virtuais e das teleperícias. “Esse uso da tecnologia me parece fundamental para os JEFs na medida em que nós conseguimos dar, com isso, vazão a uma velocidade muito grande de demandas com todos os percalços e com toda a dificuldade de acesso. (...) Portanto, eu sou um entusiasta de que o acesso ao JEF se dê da maneira mais informal possível e da maneira mais tecnológica possível”, afirmou Ney Bello.
“Portanto, eu sou um entusiasta de que o acesso ao JEF se dê da maneira mais informal possível e da maneira mais tecnológica possível”. Desembargador federal Ney Bello.
“A pandemia nos trouxe essa nova realidade virtual que vem nos ajudando a dar vazão às demandas. Há um grande número de audiências que podem ser feitas dessa forma. A teleperícia ainda encontra certos obstáculos, e muitos médicos não aceitam essa forma de atendimento. Mas isso precisa ser atualizado. Há casos menos complexos que podem ser tocados adiante e isso garantiria o acesso à Justiça a muitas pessoas”, disse o coordenador dos JEFs da 1ª Região.
Ao finalizar sua apresentação, Ney Bello enfatizou a necessidade de o Judiciário encontrar uma solução para que os jurisdicionados que estão incluídos digitalmente, como também os que não estão, tenham acesso à Justiça. Em seguida, foram realizadas seis oficinas simultâneas com a participação de dois magistrados da Justiça Federal da 1ª Região.
Reunidos em oficinas, uma delas tratou do tema Juizados Especiais Itinerantes como estratégia de acesso à Justiça e de oferta de serviços intersetoriais às populações. Na oportunidade, a juíza federal da SJPA e auxiliar da Presidência do CNJ Lívia Cristina Marques Peres falou sobre sua experiência na itinerância no norte do Brasil.
“A itinerância na Amazônia não é uma itinerância para garantir mobilidade, é para garantir acesso, para garantir direitos fundamentais. São pessoas que são totalmente invisíveis, e essas pessoas não vão bater à porta do Judiciário porque não temos estrutura em todas as localidades, como também essas pessoas não conhecem seus direitos”, explicou a juíza federal.
Segundo Lívia, o Poder Judiciário não tem o número de varas na Amazônia como existem nas demais Regiões do País. Essa circunstância justifica a realização dos itinerantes na Região sob jurisdição do TRF1. A magistrada destacou: “Quando olhamos para o Amazonas, que é um estado enorme, nós temos apenas duas localidades com varas federais, Tabatinga e Manaus. Então, a região norte, com seis estados, tem 23 municípios-sede de juizados. As dificuldades de atendimento da população e na garantia de acesso são muito grandes, e isso vai demandar uma logística e um trabalho diferenciado para garantir a prestação jurisdicional na 1ª Região”.
Encerrando a participação dos magistrados da 1ª Região no seminário do CNJ, a desembargadora federal Daniele Maranhão coordenou os debates da oficina que abordou o tema “Como potencializar a conciliação nos Juizados Especiais”. A magistrada introduziu as temáticas Juizados Especiais e Conciliação, consideradas por ela como suas duas paixões.
“Juizados e Conciliação, ou seja, tudo aquilo que se refere a vanguarda, modernidade e realização da Justiça, sem em nenhum momento descredenciar pelo fato de tratarmos de formas de Justiça célere, mas que na verdade são, mais que tudo, efetivas”, afirmou Daniele. Colaboraram com os debates, nessa etapa, a desembargadora federal do TRF3 Daldice Maria Santana de Almeida e o juiz de Direito do TJSP Ricardo Cunha Chimenti.
Vale lembrar
Os JEFs processam e julgam de forma rápida e simplificada as causas cíveis de menor complexidade de competência da Justiça Federal cujo valor não excedam a 60 (sessenta) salários-mínimos e as causas criminais que tratem de infrações de menor potencial ofensivo envolvendo a União, suas autarquias, fundações e empresas públicas.
A presença de advogados para propor uma ação é dispensável. Assim, a pessoa pode se dirigir ao JEF munida dos documentos necessários sem ter que contratar um advogado particular.