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Olhar humanizado

Núcleo de Práticas Restaurativas do Distrito Federal aposta em criatividade e sensibilidade na escuta de ofensores e vítimas para resolução consensual de conflitos

Patrícia Gripp e Larissa Santos

Abril 2022

 |   Ed.

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Olhar humanizado

Mudar o olhar da Justiça e das partes do processo para a solução do conflito é a premissa da Justiça Restaurativa (JR). Essa metodologia tem base na escuta sensível das partes envolvidas em processos acerca de infrações penais de menor e de maior potencial ofensivo, a fim de resolver o conflito.


A Justiça Restaurativa reúne facilitadores do Judiciário e pessoas afetadas por um fato delituoso (ou ilícito penal) para dialogarem sobre o crime e suas consequências. O objetivo é a superação do trauma vivenciado pela vítima, a responsabilização e conscientização do ofensor e a reparação dos danos causados, além do acerto de compromissos futuros para que a infração penal não se repita.


Um dos pioneiros na Justiça Restaurativa na Justiça Federal da 1ª Região, o juiz federal Osmane Santos explica que, nessa modalidade, “o ofensor se responsabiliza e passa a entender o caráter ilícito do ato que ele cometeu. A partir daí, passamos a empoderar vítima e ofensor para que possam dialogar sobre as consequências daquele ato, sobre as necessidades e desejos de cada um e o motivo daquele conflito”.


Nesse sentido, a JR é orientada pelos princípios da participação, voluntariedade, consensualidade, urbanidade, informalidade, imparcialidade, atendimento às necessidades dos envolvidos, correponsabilidade, empoderamento, confissão formal e circunstanciada da prática dos fatos, reparação dos danos, confidencialidade e celeridade.


A ideia é propor alternativas penais para conflitos, reduzindo as medidas de privação de liberdade – que são extremas –, restaurando as relações e promovendo a cultura da paz, a partir da responsabilização com dignidade, autonomia e liberdade.


JR na 1ª Região

Vista como a “justiça do futuro”, a Justiça Restaurativa foi adotada na Primeira Região a partir da Resolução Presi 18/2021, a fim de complementar o modelo tradicional da prestação jurisdicional.


Para implementar e desenvolver a Política de Justiça Restaurativa no âmbito da Justiça Federal da 1ª Região, o normativo prevê a adoção, entre outras medidas, tais como: definição dos critérios de atuação sistêmica, interinstitucional, intersetorial e interdisciplinar da prática restaurativa; monitoramento e avaliação dos dados estatísticos e estabelecimento de ações coordenadas para permitir o desenvolvimento da política restaurativa.


Além disso, a Portaria prevê o incentivo e a promoção de capacitação, treinamento e atualização permanente de magistrados, servidores e voluntários nos métodos e nas técnicas de justiça restaurativa.


Para coordenar e gerir a JR na 1ª Região, o TRF1 instituiu o Núcleo de Justiça Restaurativa (Nujures), vinculado ao Sistema de Conciliação da 1ª Região (SistCon), presidido pelo coordenador do SistCon e composto por um juiz federal, um servidor do Tribunal e dois servidores da 1ª Região.


O normativo também prevê a criação de Núcleos de Prática Restaurativa (NPRs) em cada Seção e Subseção Judiciária, com funcionamento vinculado aos Centros Judiciários de Conciliação (Cejuc) ou aos Serviços de Conciliação (Secon) sob a supervisão do respectivo juiz federal coordenador.


Expansão na JF1

Reforçando o compromisso da JF1 para implementação da Justiça Restaurativa como forma alternativa à resolução de conflitos penais, a Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF) inaugurou, no dia 11 de abril, o Núcleo de Práticas Restaurativas (NPR) da Seccional.


Durante a solenidade de inauguração, o então presidente do TRF1, desembargador federal I’talo Fioravanti Sabo Mendes, afirmou que a Justiça Restaurativa significava “uma nova forma de entender a Justiça”. Para ele, o Judiciário precisa ser remodelado e acompanhar a contemporaneidade no que se refere à resolução de conflitos, seja por meio da conciliação ou da restauração.


“Esse é justamente o papel da Justiça Restaurativa, e é isso que quer, que deseja o jurisdicionado e a sociedade, uma instituição que, mais do que a represente, resolva os seus problemas. São inúmeros os caminhos que a Justiça vai buscar e todos esses caminhos vão conduzir a um elemento que é essencial para nós: a legitimidade do Poder Judiciário”, destacou o magistrado.


O diretor do foro da SJDF, juiz federal Marcelo Velasco Albernaz, em seu discurso, destacou a possibilidade de restauração das relações humanas. “Ofensa, reconciliação e responsabilização. Em outros termos, se ofender alguém, tente se reconciliar; se não conseguir a reconciliação, é provável a responsabilização, e a reconciliação geralmente passa pelo reconhecimento da ofensa pelo infrator e pela concessão de perdão pelo ofendido, possibilitando restaurar o relacionamento dos envolvidos para o futuro, reparando a repetição de erros do passado, com isso torna-se possível promover em maior extensão a cultura de paz”, exemplificou o magistrado.


A coordenadora do NPR da SJDF, juíza federal Rosimayre Gonçalves de Carvalho, contou que a implantação do Núcleo contou com o apoio do presidente do Tribunal à época da inauguração, desembargador federal I’talo Fioravanti Sabo Mendes; da então coordenadora do SistCon, desembargadora federal Gilda Sigmaringa Seixas; do diretor do foro da SJDF, juiz federal Marcelo Albernaz, e da procuradora da República Melina Flores. Além disso, a criação do NPR contou com o trabalho de um grupo coordenado pela juíza federal Rosumayre Gonçalves e composto por servidoras da Seccional.


Rosimayre considera que cabe ao Poder Judiciário “o permanente aprimoramento de suas formas de resposta às demandas sociais relacionadas às questões de conflitos e violência, sempre objetivando a promoção da paz social” e a Justiça Restaurativa é implementada nesse sentido.


“Os fenômenos conflito e violência são complexos, razão pela qual o manejo da JR deve considerar não só os aspectos individuais, mas também os comunitários, institucionais e sociais, que contribuem para seu surgimento e permanência. Com isso, entende-se que as soluções efetivas de conflitos incluem uma ordem jurídica justa, que inclui o uso de meios consensuais, voluntários e mais adequados para alcançar a pacificação de disputa”, ressaltou a coordenadora do NPR.


A magistrada enfatizou que a vítima e suas necessidades serão o foco da Justiça Restaurativa: “O olhar será posto na superação dos danos, em seus diversos aspectos, impostos às vítimas. Portanto, espera-se um crescimento da confiança da população no Poder Judiciário e da autonomia do cidadão, tanto do ofensor por meio da autorresponsabilização, como da vítima pela satisfação do seu interesse e necessidade”.


Funcionamento

Apesar de recém-inaugurado, o Núcleo já se prepara para entrar em plena atividade. A coordenadora do NPR informou que a primeira ação foi realizar o curso de Formação de Facilitadores, promovido pelo Nujures/TRF1, para a capacitação de servidores e colaboradores. Segundo Rosimayre, já foi contratada uma psicóloga e, em breve, também fará parte da equipe uma assistente social, além de dois servidores terceirizados e um estagiário.


Concomitante ao treinamento, está sendo feito o mapeamento da demanda e das condições estruturais mínimas para o funcionamento do NPR. “Optou-se pelo recebimento efetivo de processos somente após o término do Curso de Formação de Facilitadores, quando então seguirá o  fluxo de trabalho em conjunto com as Varas criminais, Ministério Público Federal e Defensoria Pública da União”, explicou a magistrada.


Rosimayre acredita que o Núcleo de Práticas Restaurativas da SJDF trata-se de “um novo paradigma de Justiça. A Justiça Federal do DF deu esse passo adiante de criar um novo olhar sobre os processos que estão sob a nossa jurisdição”.

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