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Reprodução/Diário Online.com.br

Imprudência

Escalpelamento continua mutilando populações ribeirinhas na Região Norte em virtude da imprudência e da desobediência às orientações da Marinha

Jair Cardoso/TS | Ed. 84 Dez 2017/jan 2018

Anualmente, o acidente chamado de escalpelamento, longe de ser uma fatalidade, faz dezenas de vítimas nos rios que cortam os estados do Amazonas, Pará, Piauí e Maranhão. Mulheres e meninas, principalmente, carregam no corpo as marcas da imprudência, do descaso e das falhas na fiscalização. Instalado no piso do barco e sem a peça de cobertura, o eixo do motor gira em alta velocidade e pode causar danos graves nos ocupantes da embarcação. O acidente é dramático, pois arranca todo ou parte do couro cabeludo. Em alguns casos, a lesão pode afetar orelhas, rosto e pescoço, levando a deformações graves e até a morte.

 

Dados da Capitania dos Portos da Amazônia Oriental (CPAOR), organização da Marinha do Brasil, revelam que, entre 2000 e 2016, foram registrados 243 casos de escalpelamento na região Norte do País. A maior parte das vítimas, 65%, é de crianças. Os adultos em faixa produtiva representam 30%. Já os idosos, 5%. Em relação ao gênero, 95% das vítimas são mulheres. O uso de cabelos longos e soltos é um dos motivos que explica tamanha discrepância.

 

Segundo a Associação de Mulheres Ribeirinhas e Vítimas de Escalpelamento da Amazônia, entidade que agrega 140 vítimas, além das dores crônicas impostas pela mutilação, essas mulheres também sofrem com o preconceito e com a falta de políticas públicas voltadas a essas pessoas. Entre as adultas, por exemplo, somente 8% conseguem reinserção no mercado de trabalho.

 

O tratamento das lesões é outro entrave para as vítimas de escalpelamento. Em muitos casos, é necessária a realização de diversas cirurgias. A recuperação é lenta e o tratamento se prolonga pelo resto da vida, com internações frequentes para consultas e enxertos nas áreas afetadas.

 

Um caso de escalpelamento foi analisado pela 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. No recurso, a parte autora sustenta que em 12/6/2004 sofreu escalpelamento em decorrência de sério acidente a bordo de embarcação que navegava pelo Rio Barbosa. Ela conta que o fato ocorreu quando ela se aproximou do eixo descoberto entre o motor e a hélice da embarcação que lhe transportava dentro do município de Gurupá, no Pará, tendo seus cabelos brutalmente puxados pela rotação do motor, arrancando seu couro cabeludo.

 

Segundo ela, acidentes como esse somente ocorrem quando a Marinha do Brasil não cumpre seu papel de fiscalização ostensiva das embarcações que trafegam pelos rios da Amazônia, promovendo a segurança na navegação e atuando para salvaguardar a vida humana. “Em outras palavras, a omissão criou circunstância propícia para a ocorrência do acidente, pois a Marinha do Brasil tinha o dever de agir para impedi-lo, mas não o fez. Restou configurada, portanto, a responsabilidade objetiva do Estado”, afirmou.

 

 

Ao analisar o caso, os desembargadores que compõem o Colegiado rejeitaram os argumentos trazidos pela recorrente. Na decisão, o relator, desembargador federal Kassio Nunes Marques, entendeu que a própria vítima foi a responsável pelo acidente, “de modo que resta excluída a responsabilidade objetiva da União”.

 

Para o relator, não há nexo de causalidade entre o acidente sofrido pela vítima e a ação ou omissão estatal. “A imprudência causadora do acidente, nos termos do Laudo de Exame Pericial Indireto, promovido pela Capitania dos Portos do Amapá, foi da própria autora que retirou uma tábua, das que cobriam o eixo, para tirar água do casco quando teve seus cabelos enrolados no eixo”, assinalou.

 

O magistrado ainda explicou que o dever estatal de indenizar somente poderia ser admitido se a vistoria da Marinha tivesse autorizado à embarcação navegar sem a cobertura do eixo entre o motor e a hélice. “No entanto, a prova dos autos é no sentido de que a embarcação, embora não inscrita na Marinha, era dotada de proteção do eixo de rotação. Enfim, não há nexo de causalidade eficaz entre a alegada omissão e o dano sofrido pela autora, o que afasta a responsabilidade da União”, concluiu.

 

Marinha em ação – O capitão dos Portos da Amazônia Oriental da Marinha do Brasil, José Alexandre Santiago e Silva, pondera que a decisão proferida pelo TRF1 retrata a “vida como ela é”, visto que, infelizmente, a maioria dos acidentes é responsabilidade da própria vítima. “O maior índice de escalpelamento ocorre no Pará e no Amapá, principalmente na região do Marajó, devido à cultura do uso de embarcações construídas de forma artesanal pelos ribeirinhos, com motor exposto no centro do barco, o qual é usado como meio de transporte de familiares e de mercadorias de subsistência até as cidades”, conta.

 

 

 

Para conscientizar a população, a Capitania dos Portos promoveu, em 2001, o “Programa Segurança da Navegação da Amazônia (PSNA)”, que objetiva desenvolver campanhas voltadas para a segurança da navegação, a salvaguarda da população humana e a prevenção da poluição hídrica. “O PSNA é composto de seis projetos, sendo um deles, chamado de ‘Educando para Evitar Sofrimento’, voltado para a promoção de ações educativas em escolas e comunidades ribeirinhas. O projeto também fornece e instala, gratuitamente, a cobertura do eixo e das partes móveis das embarcações”, explica o capitão.

 

Além disso, José Alexandre destaca que nas ações educativas são distribuídas cartilhas lúdicas com informações de como os passageiros devem se portar dentro das embarcações. “É importante que as mulheres prendam os cabelos longos. Também é fundamental que crianças não viajem em embarcações que estejam com seus eixos descobertos e que denunciem à Capitania dos Portos quaisquer irregularidades encontradas a bordo”, sugere.

  Marinha realiza trabalho de conscientização junto à população  

  ribeirinha de forma periódica  

  Capitão Santiago destaca o perigo das embarcações  

  artesanais sem cobertura de motor  

A Lei 11.970/2009,

de autoria da deputada federal Janete Capiberibe, obriga a instalação de carenagem no volante e eixo dos motores dos barcos estacionários adaptados à navegação ribeirinha como forma de prevenir os acidentes com escalpelamento e mutilação.

 

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 3.397/2012 que obriga o

Sistema Único de Saúde (SUS) a realizar cirurgias plásticas reconstrutivas nas vítimas de escalpelamento e a prestar assistência social e psicológica às mulheres que sofrem com esse tipo de acidente.  

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