Samuel Figueira/
Proforme /
ENTREVISTA
Integrante do TRF1 há 20 anos, o desembargador federal
Carlos Moreira Alves
inicia, em abril, sua gestão como presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O magistrado destaca aqueles que entende serem os maiores desafios para a nova Administração e revela como pretende lidar com as limitações financeiras, de recursos humanos e tecnológicos para manter o andamento dos projetos estratégicos da instituição e dar continuidade aos investimentos voltados para a melhoria da prestação jurisdicional.
Por Thainá Salviato | Ed. 87 Abr 2018
O desembargador federal Carlos Eduardo Maul Moreira Alves será presidente do TRF 1ª Região durante o biênio 2018-2020, ao lado do vice-presidente, desembargador federal Kassio Nunes Marques, e da corregedora regional da Justiça Federal da 1ª Região, desembargadora federal Maria do Carmo do Cardoso.
Em entrevista à Primeira Região em Revista, o magistrado revela as expectativas para a gestão à frente do maior tribunal regional federal do Brasil. “Sabemos que as dificuldades são proporcionais ao tamanho e à diversidade da nossa jurisdição continental, mas a ideia é andarmos lado a lado para fazer o nosso melhor em benefício dos nossos próximos”.
O novo presidente falou das dificuldades orçamentárias, ampliadas com a crise que assola o País, e da necessidade urgente de melhorar a infraestrutura de TI do TRF1. “As restrições orçamentárias são grandes, e nós temos que ter muita criatividade para enfrentar os problemas. A tecnologia da informação tem que ser prioridade e nós temos que ver, dentro dos instrumentos que a lei nos possibilitar, como é possível ampliar o quadro voltado para essa área”.
Moreira Alves falou, ainda, das Câmaras Regionais Previdenciárias (CRPs), dos projetos estratégicos em andamento, como o Procin-Jud, das ações voltadas para a mediação e a conciliação e das pretensões da nova Administração para a continuidade e expansão desses e de outros projetos estratégicos em andamento.
Confira!
Como o senhor se sente diante da incumbência de presidir o maior dos Regionais, com jurisdição sobre mais de 80% do Território Nacional?
É como um grande desafio, com certeza. Nós sabemos que as dificuldades são proporcionais ao tamanho e à diversidade das realidades que nós temos nesta nossa jurisdição continental. São muitos estados, muitas unidades da Federação e com realidades diferentes em relação, em última análise, a quatro regiões geográficas do Brasil, porque nós temos unidades da Federação de todas as regiões do Brasil, à exceção da região Sul. Temos a realidade do Norte, que é diferente da realidade da região Nordeste, que por sua vez é diferente da realidade da região Sudeste, que a seu turno é diferente da realidade da região Centro-Oeste. O grande desafio é realmente conciliar essas dificuldades e fazer com que o trabalho se desenvolva em torno de todas elas.
Estamos enfrentando uma grave crise econômica no País, desde 2016, e isso se refletiu no orçamento do Poder Judiciário, inclusive. Apesar de o Tribunal vir adotando algumas medidas de gestão que têm minimizado o impacto orçamentário da crise, as restrições ainda são grandes e devem continuar. De que maneira o senhor pretende lidar com as restrições orçamentárias ao longo deste biênio?
Na verdade, já participo da vida do Tribunal indiretamente desde 1990, quando designado para atuar como membro ainda do Ministério Público Federal junto a este Tribunal e, diretamente, digamos assim, desde 1998, como integrante da Corte pelo quinto constitucional. Já se vão 28 anos, quase coincidentes com o início do Tribunal, fato que a própria história mostra que foi o maior dos desafios.
Acredito que por maiores que sejam as dificuldades atuais, elas não são nem serão maiores do que as vividas por aqueles que tiveram que efetivamente instalar e implantar os trabalhos da Corte, com toda a precariedade que nós sabemos que existiu no momento inicial. Foram dificuldades de toda ordem, recursos humanos, recursos materiais, recursos orçamentários e, ao longo destes 28 anos, nós temos visto as mais diversas dificuldades orçamentárias.
Agora vivemos um desdobramento disso, não há dúvida nenhuma. As restrições orçamentárias são grandes, mas, sou daqueles que entendem que, geralmente, as grandes soluções vêm exatamente nas grandes dificuldades. Quando os recursos são fartos, geralmente nós nos acostumamos a trilhar pelo caminho mais confortável do conhecido, daquelas facilidades que a fartura nos oferece.
Mas quando nós temos restrições, principalmente de ordem material, que é, em última análise, o que determina o funcionamento de tudo, nós temos que ter muita criatividade para enfrentar os problemas, refletir sobre eles e, principalmente, muito compromisso. Certa feita, em uma espécie de agradecimento que fiz ao nosso saudoso colega, já falecido, desembargador federal Mauro Leite Soares, registrei uma frase que faz parte da minha convicção. Eu disse que o amor e os sonhos são a semente da vida. Eu realmente acredito nisso. Nós temos que ter compromisso com as coisas, ter amor naquilo que nós fazemos, e a preocupação estampada naquilo que é o resultado final do nosso trabalho. A gente sabe que do nosso trabalho depende a sorte de muitas pessoas. Então, assim como nós, que quando somos atendidos, queremos o melhor daqueles que têm o dever de nos atender, temos que ter a exata noção desta responsabilidade quando somos nós aqueles que atendemos. O que eu espero realmente é que sejamos todos uma equipe, que sejamos de corpo e espírito uma unidade, magistrados, servidores, prestadores de serviços, estagiários, enfim, todos, porque, na verdade, todos nós temos um ideal comum e um dever comum, que é o de proporcionar àqueles que precisam da Justiça o melhor resultado possível.
O TRF prossegue desenvolvendo projetos no intuito de aprimorar a prestação jurisdicional. Em fevereiro deste ano colocou em atividade o Procin-Jud, que é o processamento inteligente. É um projeto estratégico que trouxe uma nova rotina à gestão processual em atendimento ao novo CPC no que diz respeito ao tratamento de demandas repetitivas. Para dar andamento ao projeto foi necessária uma reorganização do organograma da instituição, inclusive com a criação de uma nova secretaria e remanejamento de servidores e unidades. Além desse, outros projetos estratégicos também estão em andamento. Eles terão continuidade na sua gestão?
Como o próprio nome diz, um projeto é estratégico quando ele retrata uma estratégia de evolução, porque obviamente tudo que nós pensamos, pensamos prospectivamente e evolutivamente. Quer dizer, nós desejamos obter com esses instrumentos, e os projetos estratégicos são instrumentos, resultados melhores, resultados que façam com que nós consigamos atingir aquilo que é o nosso ideal, uma produtividade maior, sem o comprometimento da qualidade dos nossos trabalhos, porque as coisas têm que andar, a meu ver, juntas, quantidade e qualidade. Na verdade, na Justiça, o trabalho é artesanal, porque obviamente cada processo envolve uma situação de fato particular que tem que ser examinada e artesanalmente projetada para receber a sua solução individual. Só que os números são plurais e cada vez eles se multiplicam. Então, na verdade, hoje nós temos uma demanda crescente, cada vez, felizmente, mais amplo o acesso da população à jurisdição, mas, obviamente, quanto maior a amplitude desse acesso, maiores são as dificuldades porque os nossos recursos, diria até mesmo tecnológicos, não conseguem acompanhar essa evolução na mesma velocidade. Então, é por isso que precisamos realmente de estratégias, de projetos estratégicos, para tentar multiplicar esses nossos instrumentos em termos de produção e qualidade de produção. Então obviamente não há como se pretender afastar-se de projetos estratégicos. Todos eles terão a sua continuidade, até porque eles representam sempre uma boa ideia. O que nós temos que ver, acompanhar, e isso o tempo vai dizendo em relação a cada um deles, é o resultado dessas nossas expectativas, daquilo que nós depositamos de esperança quando começamos com esses projetos. Em termos gerais, sobre os projetos estratégicos é essa a minha visão, como de todas as coisas, a de continuidade e aperfeiçoamento. Obviamente, a gente quer continuar tudo aquilo que está funcionando e com a ideia sempre de aperfeiçoar, pois exatamente o ser humano é uma imperfeição em si mesmo; nós temos que estar sempre na busca de melhorar as nossas coisas, os nossos desempenhos. Essa seria uma visão global sobre as questões estratégicas e, particularmente, sobre o Procin-Jud, um mecanismo muito novo, como muito novo é o Código de Processo Civil e, como toda novidade, com as inovações que traz, ela traz dificuldades e desafios que nós precisamos vencer e, como todo desafio, nos instiga a criar. Essa questão das demandas repetitivas é algo que na verdade não é novo, os instrumentos vão se renovando, mas temos visto que, com a própria ampliação do acesso das pessoas à jurisdição, as questões tendem, muitas delas, a se repetir, com a particularidade que cada fato representa dentro daquele universo aparentemente geral. Pelo que vi, pretende-se, com autorização legal, a possibilidade de se delegar o poder decisório a magistrados para que, concentradamente, verifiquem, antes da distribuição dos processos, se as causas estão dentre aquelas que já foram julgadas pelos tribunais superiores em demandas repetitivas e, com isso, concentrar em menos mãos esse poder decisório. Não há necessidade de se distribuir essas causas para os vários membros do Tribunal que têm competência para fazê-lo porque isso realmente prejudica a produção. Então, acho a ideia extremamente válida; só é preciso avaliar com cuidado os resultados, porque realmente é uma iniciativa muito nova. Tenho aqui a resolução que materializou o funcionamento desse programa e ela instrumentaliza uma decisão do Conselho de Administração de 19 de outubro do ano passado, quer dizer, não se passaram ainda nem seis meses. Houve realmente uma alteração da estrutura administrativa e do pouco que vi, uma alteração bem significativa na estrutura de funcionamento do próprio Tribunal, que tem outras atividades junto com essa, na sua atividade-fim. Se não me trai a memória, a própria resolução, já ciente das dificuldades que toda reestruturação traz, estabelece um prazo de um ano para avaliação dos resultados. Quer dizer, a própria resolução, já ciente da incógnita que é sempre uma reestruturação de um órgão, e com essa profundidade, ela já prevê uma análise, uma avaliação dos resultados. Vamos ouvir os vários setores, porque todos nós sabemos que um resultado é satisfatório quando há um aumento de produtividade sem um grande sacrifício daqueles que são responsáveis por esse aumento de produtividade. O que o projeto quer, em última análise, é isso: otimizar o trabalho de todos, otimizar o resultado, e a ideia de que obviamente todas aquelas pessoas que sejam responsáveis por esse trabalho possam realizá-los normalmente.
Nessa mesma linha de inovação, as Câmaras Regionais Previdenciárias vêm apresentando bons resultados, tanto que o Tribunal prorrogou o prazo de funcionamento desses órgãos até fevereiro de 2019. Como o senhor avalia a atuação desses órgãos descentralizados? Acredita na possibilidade de criação de novas CRPs?
Na verdade, essas câmaras previdenciárias, a exemplo do Procin-Jud e de vários outros projetos estratégicos, são instrumentos valiosos. Eu não conheço as câmaras regionais de perto, não acompanho de perto a produtividade, os resultados desses órgãos porque, embora tenha ingressado no Tribunal há quase 20 vinte anos exatamente em Seção cuja competência é abarcada por essas câmaras previdenciárias, e tenha exercido a jurisdição na 2ª Turma por 11 anos, estou afastado, inclusive dos resultados não só da própria 1ª Seção do Tribunal, por suas 1ª e 2ª Turmas, como das CRPs, porque na época em que lá atuava elas ainda não existiam. Mas, pelo que sei, os resultados são muito bons e, obviamente, quando os resultados são satisfatórios, a ideia é sempre de manter, aperfeiçoar e ampliar o que está funcionando, se nos permitirem os recursos materiais, porque sabemos que aqui no Tribunal as exigências e atribuições são muitas e os recursos humanos, todos nós, magistrados e servidores, são muito escassos para atender a tudo isso. Mas todos esses projetos nada mais são do que o exercício da criatividade para a gente tentar otimizar aquilo de que dispomos.
Qual é a posição do novo presidente em relação à criação dos novos TRFs, porque essas Câmaras Regionais Previdenciárias estão previstas na Constituição e foram uma alternativa adotada na gestão do desembargador federal Cândido Ribeiro, época do auge do debate quanto à criação de novos regionais. O que o senhor pensa a esse respeito?
A pergunta é muito específica em relação à criação de novos tribunais, mas eu vou procurar dar um caráter mais amplo, porque eu acho que a questão é um pouco mais ampla. Nós temos uma realidade constitucional existente em que, se não me engano, foi proposta a criação de novos quatro tribunais regionais federais, por emenda constitucional, processo que está em demanda judicial aguardando decisão da Suprema Corte. Quando da criação do Tribunal, em 1989, eram 18 juízes do TRF1, e 45 juízes em 1º grau de jurisdição da Primeira Região. Nesses quase 30 anos que se passaram, nós crescemos em nove, hoje somos 27 no TRF1 e 560 juízes federais, titulares e substitutos. Também foram criados juizados especiais federais, turmas recursais que, embora na minha percepção acabem formando uma jurisdição independente do Tribunal, porque os processos jurisdicionalmente são resolvidos pelos juízes desses juizados e submetidos em 2º grau às Turmas recursais específicas, na verdade, todos esses juízes são vinculados ao Tribunal e, obviamente, a produção de 45 é muito diferente da produção de mais de 500. Então, na verdade, os nossos serviços estão estrangulados, o acesso à jurisdição se ampliou, consequentemente as demandas se multiplicaram e nós estamos vendo que 27 membros, sendo que apenas 24 atuam, efetivamente, digamos assim, na atividade-fim, que é a do julgamento de recursos, é um número absolutamente insuficiente para dar conta dessas atividades. E a gente tem que pensar que não é apenas o número de processos que nós precisamos julgar, são as sessões, são as várias comissões que nós temos que compor, são os vários órgãos jurisdicionais em que nós atuamos, então, para atender a isso, ao longo desse tempo também houve vários projetos de ampliação do número de membros e, realmente, é imprescindível que uma ou outra solução seja efetivada ou que realmente se criem novos tribunais. Mas eu falo de criação efetiva, com instalação em começo de atividades, ou aquilo que é mais viável em tempos de escassez orçamentária, que é o aumento do número de juízes do Tribunal. Isso é evidentemente mais viável e, acredito eu, inevitável, porque realmente estamos, se já não estamos nele, nos aproximando do caos, com esses números que as estatísticas indicam.
O senhor vai compor o Conselho da Justiça Federal como presidente do TRF1. Pretende levar para o Conselho esse tema e retomar a questão da criação dos regionais ou de ampliação do TRF1?
Do que eu saiba já está em andamento junto ao Conselho da Justiça Federal uma dessas propostas. Obviamente, como disse, essas questões são muito recentes para mim e não estou a par do estágio atual delas. Tenho que saber quais são as propostas efetivamente que estão em pauta, mas, obviamente, serei fervoroso na defesa dessa ideia, porque realmente nós que trabalhamos aqui sabemos a dificuldade que é e a angústia, mais que a dificuldade, de você não poder mais estabelecer sequer prioridades, porque nem mesmo para as prioridades estamos conseguindo instrumento para mantê-las razoavelmente em dia. É uma progressão geométrica e, por mais comprometimento, por mais boa vontade, por mais amor que tenhamos à causa, nós temos um limite humano, físico. O nosso Tribunal se assemelha ao Brasil, ele é um continente porque, na verdade, somos a única Região que engloba quatro regiões geográficas. Vemos que o TRF2 tem uma área territorial muito menor com os estados do Espírito Santo e do Rio de Janeiro; o TRF3 engloba apenas São Paulo e Mato Grosso do Sul; o TRF5 é composto por estados de uma região geográfica heterogênea, a Nordeste, e o TRF4, a mesma coisa, uma área também heterogênea, a Região Sul. Aqui somos, na prática, quatro regiões, sem contar as características físicas principalmente da região Norte, porque são absolutamente anômalas. Quem conhece a Região Amazônica sabe que os serviços, em plena era da informática, se realizam de barco. Nem mesmo o computador consegue chegar a alguns lugares, por incrível que pareça.
As práticas de conciliação e mediação têm se mostrado importantes aliadas à redução da judicialização e ações desenvolvidas no âmbito do Sistema de Conciliação da 1ª Região (Sistcon) foram premiadas pelo CNJ em 2017. Quais os planos da Administração para essa área?
A conciliação, desde que ela foi instituída de forma efetiva, tem sido, talvez, a revolução mais silenciosa que nós tenhamos na estrutura do Poder Judiciário. Confesso eu que comecei minha jornada junto à Justiça, ainda no Ministério Público, há quase 34 anos e era algo inimaginável você pensar em órgãos públicos participando de acordo. Era uma realidade em que nem existia computador, nem se falava nisso. Hoje é uma realidade efetiva porque a própria Administração Pública enxergou a importância do acordo, da cultura da conciliação. Porque, na verdade, conciliar nada mais é do que a gente ter a percepção de que a vida é um jogo de perder e ganhar, e a gente tem que saber sempre quando é o momento de a gente perder, quando é o momento de a gente ganhar. Então, conciliar significa isso, você estar aberto para ver aquilo em que, mesmo que você tenha o direito a que um texto lhe dá, você pode ser flexível, permeável em relação a ele para também ver as dificuldades de quem está na outra ponta, porque normalmente nós pensamos em Direito, nós pensamos na nossa posição, nós não nos preocupamos com quem está na outra ponta. Então, essa cultura, que não deve ser nem pensada como estrutura de Poder Judiciário, mas como estrutura realmente de tecido social de conciliação, na verdade, acaba sendo, em última análise, uma cultura de amor ao próximo. Então, eu acho que isso realmente é a grande pedra de toque que tem que ser incentivada na nossa sociedade. Hoje, nós vemos muita violência por conta até disso. As pessoas se imbuem muito nos seus direitos e, às vezes, até instintivamente se afastam das suas responsabilidades. Eu vejo, particularmente, a conciliação com muito carinho e, obviamente, como eu disse, é algo que já existe, já está funcionando com excelentes resultados, e nós não podemos nunca nos acomodar, nós temos sempre que procurar ver aquilo em que nós podemos melhorar.
Mesmo com as limitações orçamentárias, o TRF tem trabalhado na modernização de seus sistemas eletrônicos e na melhoria de sua infraestrutura e gestão de Tecnologia da Informação (TI). As ações e projetos em TI continuarão sendo prioridade na sua administração?
Hoje, a gente vê a importância da informação, a velocidade e o que isso representa em termos até mesmo de consequência, porque também brinco com os meus amigos que a minha cabeça ainda é analógica, daquela época em que o telefone era um bem que a gente declarava no imposto de renda e que quando ia fazer uma ligação em interurbano, a gente tinha que esperar umas cinco horas para a ligação se completar. Eu brincava: naquela época era muito bom porque quando as crises se instalavam em algum lugar, a informação demorava tanto tempo para chegar que quando ela chegava, já não tinha mais crise, já tinha tudo se resolvido. E hoje a gente vê que, na época daquilo que eu chamaria da revolução tecnológica, a informação está numa velocidade tão impressionante que nós, até instintivamente, estamos fazendo as coisas quase que on-line. Nós vemos que, nesta época da velocidade da informação aqui no Tribunal, nós temos colapsos na TI e na própria informação, porque tudo isso depende de recursos humanos, financeiros, e a nossa estrutura é muito acanhada. Os nossos servidores e colaboradores de TI, a exemplo dos demais servidores do Tribunal, mas eu diria com uma pontinha a mais, eles são os verdadeiros heróis. Nós temos vários sistemas de informática e dificuldades. Hoje, a gente tem alguns programas em que para você visualizar o documento você leva, às vezes, algo em torno de 10, 15 segundos, que podem parecer um espaço de tempo muito pequeno, mas, se você multiplicar isso pela dinâmica do número de processos que a gente tem, isso se torna um problema. E o colapso na área da tecnologia da informação significa, em última análise, o colapso de todo o Tribunal, de toda a nossa atividade-fim. Então, obviamente, se há uma prioridade que tem que ser “prioritária” (não fosse uma redundância, um pleonasmo, a gente usar da expressão), obviamente a tecnologia da informação tem, necessariamente, de ser prioridade. Nós temos que, com criatividade, dentro dos instrumentos que a lei nos possibilitar, ver como é possível ampliar o número de pessoas que estejam efetivamente voltadas e lotadas nessa área, porque, do que é do meu conhecimento, realmente, nosso quadro é mais do que acanhadíssimo; ele, realmente, é quase que inexistente. São os heróis que estão na linha de frente, que recebem as reclamações, mas nem sempre lhes chegam os elogios que todos nós fazemos, ainda que para os nossos botões. Aliás, considero todos nós, magistrados, servidores, realmente, heróis, porque, para dar conta desses números que nós temos, e que muitas pessoas dizem que são insignificantes, irrisórios, só nós sabemos o empenho que nós temos, a angústia e as dificuldades que nós temos. E ninguém melhor do que nós para avaliar. Eu realmente espero que todos os servidores, que todos os magistrados se sintam uma unidade valorizada, porque, como eu disse, na minha percepção, o valor tem que ser buscado na gente. A gente não tem que esperar um reconhecimento dos outros, porque nós sempre temos o reconhecimento de pessoas e às vezes nem sabemos. Então, na minha concepção, eu espero realmente, de coração, que todos nós tenhamos compromisso e a exata noção do quão importante é o nosso papel e o nosso desempenho. A gente não deve esmorecer nunca. A gente sabe que os salários não são os ideais, embora todos achem que vivamos num paraíso de facilidades em que trabalhamos pouco e ganhamos muito. Sabemos que a realidade não é essa, mas nós não podemos deixar que essas dificuldades sejam maiores do que o amor e o compromisso que a gente tenha com os nossos resultados, que não são para nós. Às vezes, também para nós, porque também nós, às vezes, somos destinatários da Justiça, porque todos precisamos dela.
A modernização dos sistemas eletrônicos se alinha ao tema sustentabilidade, em que está inserido o Plano de Logística Sustentável (PLS) da Justiça Federal da 1ª Região. O Plano busca a eficiência da gestão, racionalização dos gastos públicos e consumo sustentável. O Conselho da Justiça Federal aprovou recentemente o Manual de Sustentabilidade e Eficiência Energética, que deverá ser observado pela Justiça Federal. Que espaço o tema sustentabilidade terá na agenda da nova gestão?
Se a gente pensar bem, essa tese da sustentabilidade da gestão, na verdade, não é uma perspectiva só institucional. Ela é uma perspectiva de vida. Se a gente pensar, nós somos gestores no nosso dia a dia, e, obviamente, a sustentabilidade nada mais é do que a vinculação, digamos assim, da própria vida dos seres humanos, porque é um paradoxo. Tudo de que nós necessitamos vem da natureza. Os nossos anseios e os nossos reclamos materiais são cada vez maiores. Para que eles sejam atendidos, cada vez mais, a natureza tem que ser acionada e, ao mesmo tempo, a natureza tem que ser preservada. Então, a pedra de toque dessa equação é exatamente como se atender aos seres humanos, que, na verdade, também crescem em proporção geométrica no mundo, dentro de um equilíbrio em que a gente possa pensar na própria existência das futuras gerações, porque não há futuro sem natureza, sem meio ambiente, sem sustentabilidade. É muito bom, muito atual, que esse tema esteja sendo pensado institucionalmente, porque não é só a questão da economia de recursos financeiros que isso traz, obviamente, é economia mesmo do ambiente e do tempo de que a natureza necessita para se recuperar, para se regenerar e para se reinventar. Esse também é um projeto estratégico que, como os demais, tem que ser permeado pela realidade instrumental de que dispusermos, seja em termos de recursos humanos, de recursos financeiros, enfim. Mas, realmente é muito bom, eu acho que para a humanidade que o ser humano, como um todo, pare um pouco para refletir sobre o que precisamos fazer para que a natureza possa sempre nos dar aquilo de que nós sempre precisamos e precisaremos. Na minha perspectiva, na verdade, todas as questões transcendem às instituições. Se nós pensarmos que as instituições nada mais são do que uma abstração concretizada pelas pessoas que lhes dão ouvidos, nós vamos pensar que isso é uma realidade social, porque em tudo que a sociedade atua como um todo reflete-se em particular nas respectivas instituições onde cada um de nós atua, seja no âmbito do poder público, seja no âmbito da iniciativa privada.
Que mensagem o senhor deixaria para os seus pares e também para os servidores e colaboradores da Primeira Região nesse início de gestão sob sua condução?
Eu acho que a expressão mais correta é “ladeada” por alguém. Eu acho que atuamos todos lado a lado. A sociedade tem necessidade de se estruturar hierarquicamente para que as coisas sejam coordenadas, mas, na verdade, não há quem encabece, na minha perspectiva, e quem seja encabeçado, porque todas as pessoas têm que ter voz, todas as pessoas têm que ter iniciativa e, principalmente, todas as pessoas têm que ter sentimento, voltando àquela questão do amor e dos sonhos que, na verdade, é um resumo do compromisso que todos nós temos que ter. Então, a esperança, a expectativa ou a palavra que seja empregada, que eu tenho, é exatamente a mesma daquela mensagem: que formemos um corpo e um espírito únicos. Que realmente nós estejamos empenhados em ações, em espírito, em coração para que realmente a gente possa superar os desafios, porque toda gestão é um período muito curto de tempo. Todos os gestores passam, nós todos vamos passando. Nós todos somos finitos. Temos um momento em que vamos nos despedir, não só das nossas instituições, mas da própria vida terrena, e nós temos que ter a visão prospectiva, quer dizer, o que nós queremos? É a pergunta que todos fazem. O que nós queremos para os nossos futuros, para as nossas gerações, para os nossos filhos, para os nossos netos, enfim, para aqueles que aqui estão começando na Terra essa jornada e ainda têm um caminho mais longo a seguir e para aqueles que ainda nem nasceram, nem para cá vieram, mas que um dia virão, e espero que tenham a mesma felicidade que nós experimentamos. A ideia é esta: de andarmos não encabeçados por ninguém, mas lado a lado, todos, e com a vontade, realmente, de fazer o melhor que nós possamos em benefício dos nossos próximos. Eles precisam muito de nós.